Redução da jornada de trabalho e o fim da escala 6×1

A professora Carina Ribeiro de Carvalho Costa defende a redução da jornada de trabalho e o fim da 6x1 com base em experiências realizadas em outros países.
2025-11-03 15:51:34
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*Por Carina Ribeiro de Carvalho Costa

Resumo

Este artigo propõe uma crítica contundente à exploração capitalista do tempo de trabalho, centrando-se na urgência da redução da jornada de trabalho e no fim da escala 6×1. Sob a perspectiva marxista, analisa-se a produção de mais‑valia através da extensão do tempo de trabalho além do necessário, bem como os efeitos desumanizadores dessa lógica histórica. A luta operária por redução das horas trabalhadas — desde as jornadas de 18 horas na Revolução Industrial até a conquista das 8 horas diárias — é contextualizada como conquista coletiva da classe trabalhadora. Experiências internacionais, como as jornadas reduzidas na França, Islândia e Alemanha, evidenciam ganhos em produtividade e qualidade de vida, desafiando a retórica capitalista de que menos trabalho aperta os resultados. No Brasil, o texto denuncia a naturalização da exaustiva escala 6×1, os efeitos nefastos da Reforma Trabalhista de 2017 e a precarização do trabalho disfarçada de “flexibilidade”. A partir de fundamentos teórico-históricos e dados empíricos — incluindo estudos sobre alterações na carga horária no país —, defendem-se políticas públicas que incentivem a redistribuição do trabalho, limitem as horas extras e regulamentem o banco de horas, visando não apenas justiça social, mas uma nova civilização, centrada na vida humana e no tempo livre.

Abstract

This article delivers a forceful Marxist critique of capitalist exploitation of labor time, particularly advocating the reduction of working hours and the abolition of the “6‑on‑1‑off” work schedule. Analyzing how surplus labor generates surplus value, the study contextualizes the historical struggle for shorter workdays — from the 18‑hour shifts of the Industrial Revolution to the modern eight‑hour norm — as a class-based victory. International experiences, from reduced workweeks in France, Iceland, and Germany, showcase increased productivity and well‑being, refuting capitalist claims that reduced work leads to diminished outcomes. In Brazil, the article denounces the entrenched 6‑on‑1‑off routine, the adverse consequences of the 2017 Labor Reform, and the precaritization of labor disguised as “flexibility.” Based on theoretical-historical foundations and empirical studies — including analyses of changes in working hours — the article proposes public policies to redistribute labor, restrict overtime, and regulate time‑bank systems. The argument posits that reducing the workweek is not only a matter of social justice but a step toward a new civilization that prioritizes human life and free time.

Introdução

Desde os primórdios do capitalismo, trava-se a luta pela redução da jornada de trabalho, uma batalha muito mais pela sobrevivência do que por mudança de paradigma. Segundo Marx, a jornada de trabalho é o tempo em que o trabalhador vende sua força de trabalho ao capitalista, recebendo, em troca, uma remuneração.  A lógica do trabalho incessante, da produtividade a qualquer custo, e da obediência cega à rotina “seis por um” foi naturalizada por um sistema que lucra enquanto a vida escorre. Acorda-se cedo, trabalha-se até a exaustão e morre-se sem sequer ter vivido. A jornada de trabalho longa, imposta como se fosse uma virtude moral, é, na verdade, a face mais cruel da exploração capitalista.

Em O Capital, Marx expressa sua preocupação com a exploração capitalista dos meios de produção: “Fica claro que o trabalhador durante toda a sua existência nada mais é que força de trabalho, que todo seu tempo disponível é, por natureza e por lei, tempo de trabalho a ser empregado no próprio aumento do capital. Não tem qualquer sentido o tempo para a educação, para o desenvolvimento intelectual, para preencher funções sociais, para o convívio social, para o livre exercício das forças físicas e espirituais, para o descanso dominical […]. Mas em seu impulso cego, desmedido, em sua voracidade por trabalho excedente, viola o capital os limites extremos, físicos e morais, da jornada de trabalho. Usurpa o tempo que deve pertencer ao crescimento, ao desenvolvimento e à saúde do corpo. Rouba o tempo necessário para se respirar ar puro e absorver a luz do sol. Comprime o tempo destinado às refeições para incorporá-lo sempre que possível ao próprio processo de produção, fazendo o trabalhador ingerir os alimentos […] como se fosse mero meio de produção […]. O capital não se preocupa com a duração da vida da força de trabalho.”  

Neste cenário, discutir a redução da jornada de trabalho e o fim da escala 6×1 não é apenas uma pauta trabalhista; é uma questão de humanidade. É um enfrentamento direto ao modelo que reduz o ser humano a uma máquina, e que, mesmo em meio a avanços tecnológicos e aumentos de produtividade, continua exigindo o mesmo, ou mais, tempo de trabalho.

Este artigo tem por objetivo promover uma reflexão crítica sobre a lógica da exploração do trabalho sob a perspectiva marxista. Busca-se evidenciar que o tempo livre – que deveria ser um direito – é tratado como luxo. No Brasil, mesmo após décadas de lutas trabalhistas, o regime de seis dias de trabalho para apenas um de descanso ainda prevalece, sustentado por uma cultura de servidão consentida, alimentada por um discurso meritocrático vazio e por um Estado que sistematicamente escolhe proteger o capital.

A metodologia adotada é baseada na teoria crítica marxista, com análise histórica da evolução do trabalho no capitalismo, além do estudo de experiências internacionais de redução da jornada. O foco será o Brasil: sua realidade de precarização, informalidade e adoecimento físico e mental causado por um modelo de trabalho arcaico e desumano.

1. A Crítica Marxista ao Capitalismo e à Exploração do Trabalho

Karl Marx não economizou palavras ao definir o capitalismo como um sistema de exploração brutal. Na base de sua teoria está o conceito de mais-valia, que nada mais é do que o roubo legalizado do tempo e da energia do trabalhador. A lógica é simples e perversa: o patrão paga por 4 ou 5 horas de produção, mas exige 8, 10 ou até 12. O que sobra vira lucro. O que falta vira adoecimento.

A diferença entre o valor produzido pela classe trabalhadora e o valor da força de trabalho é o que Marx definiu como mais – valia, forma de exploração característica do capitalismo. O que para o capitalista é mais – valia, para o trabalhador é mais – trabalho. A mais – valia aparece como lucro, ou seja, a exploração dos trabalhadores se dá porque eles produzem mais valor do que recebem como salário. Essa exploração pode se dar por extensão da jornada de trabalho ou por aumento da produtividade.

O tempo de trabalho necessário – ou seja, aquele suficiente para o trabalhador repor o valor de sua força de trabalho – é constantemente estendido com o objetivo de gerar tempo de trabalho excedente, o qual é apropriado pelo capitalista. Esse roubo, institucionalizado e naturalizado, é o que sustenta as grandes fortunas e também as mais perversas desigualdades sociais.

Segundo CALVETE, “O tempo de trabalho necessário varia conforme o custo de produção, o custo de vida e os avanços tecnológicos que aumentam a produtividade do trabalho. O tempo de trabalho excedente varia conforme a organização social, o poder de barganha da classe trabalhadora, o poder de barganha dos capitalistas e a posição do Estado”.

A alienação, outro conceito central em Marx, escancara o resultado dessa lógica: o trabalhador não se reconhece no produto do seu trabalho, nem tem controle sobre sua própria jornada. Trabalha por necessidade, muitas vezes sem sequer entender o motivo. Apenas obedece. Apenas executa. E a vida passa.

No sistema capitalista, existe aquele que, vendendo sua força de trabalho, produz a riqueza e aquele que a compra e se apropria da riqueza que é produzida por essa força de trabalho comprada. Segundo Marx, a riqueza só acontece pela acumulação de trabalho “dos outros”. Empresário não dá emprego, mas compra uma mercadoria chamada “força de trabalho”, e paga o mínimo possível por ela, a fim de obter mais – valia.

De acordo com Silva (2021) o que o trabalhador vende é o seu tempo. Durante esse tempo, o trabalhador não se pertence, mas pertence ao empregador, ou seja, encontra-se alienado, podendo ser comprado e vendido como uma mercadoria qualquer.

Vivemos hoje não apenas uma alienação material, mas também uma alienação do tempo. Trabalhar seis dias e descansar um é tratado como “normal”, enquanto folgar dois ou três dias por semana é visto como privilégio, como indolência. Como se o descanso precisasse ser justificado, quase pedido como um favor.

O sistema capitalista, com sua retórica de produtividade e eficiência, transformou o tempo livre em pecado. Quem o deseja é tachado de preguiçoso. Quem o defende, de utópico. Assim, perpetua-se uma cultura onde trabalhar até a exaustão é sinal de caráter, e o lazer é sinônimo de vagabundagem.

2. A Evolução do Capitalismo e a Luta do Proletariado

Marx expôs o capitalismo como sistema de extração sistemática de mais-valia, por meio da contradição entre o tempo de trabalho necessário e o tempo excedente. Estudos como o de Saad Filho (2001) reforçam que a exploração não está no salário, mas nas relações de classe e na apropriação do excedente não remunerado (Saad Filho, 2001). Loyola (2009) amplia a reflexão, apontando que a centralidade do sistema financeiro e da tecnologia questiona a atualidade da teoria marxista clássica do valor e da mais-valia (Loyola, 2009). Essas críticas mostram que o trabalhador aliena seu tempo, sua existência e sua dignidade.

O capitalismo não começou explorando trabalhadores com crachá, uniforme e carteira assinada. Começou com os camponeses sendo expropriados de suas terras, com crianças enfiadas em minas de carvão, com mulheres costurando até a madrugada e com homens operando máquinas que arrancavam dedos por salários miseráveis. Foi assim na Revolução Industrial: uma avalanche de lucro para poucos e miséria para muitos, com jornadas de trabalho que alcançavam até 18 horas diárias.

O movimento sindical surgiu como reação à barbárie. Trabalhadores, mesmo sob ameaça de morte e repressão estatal, organizaram greves, fundaram partidos operários e travaram lutas que hoje são romantizadas pelos próprios herdeiros dos patrões da época. O limite de 8 horas diárias não foi presente de Estado. Foi conquista arrancada a duras penas.

O 1º de Maio, hoje transformado em palanque para discursos vazios, nasceu do sangue de trabalhadores assassinados em Chicago, em 1886, por exigirem o óbvio: um limite para a exploração. Era isso que pediam, um limite. Apenas uma tentativa de sobreviver com algum grau de dignidade.

No século XX, sob a pressão de greves, crises econômicas e guerras, direitos trabalhistas começaram a ser consolidados: férias, 13º, descanso semanal remunerado. No entanto, com o avanço do neoliberalismo a partir dos anos 1980, esse processo foi interrompido e, em muitos casos, revertido. A ideologia da “eficiência empresarial” passou a justificar cortes, terceirizações e a volta da lógica da exaustão. Direitos viraram “gastos”, e trabalhadores passaram a ser vistos como “custos a serem reduzidos”.

Nesse cenário, o debate acerca da necessidade da redução da jornada de trabalho adquire uma dimensão mais macroeconômica: a geração de novos postos de trabalho.

3. Experiências Internacionais com a Redução da Jornada de Trabalho

Enquanto o Brasil ainda discute se trabalhar menos é possível, países desenvolvidos estão mostrando que não só é possível, mas necessário. A França, com sua jornada de 35 horas semanais, enfrentou inicialmente resistência do empresariado, mas os resultados foram claros: mais empregos, maior produtividade e melhor qualidade de vida.

Na Islândia, experiências conduzidas entre 2015 e 2019 mostraram que reduzir a jornada para 4 dias por semana não apenas manteve, como melhorou a produtividade. Menos estresse, menos afastamentos médicos, mais vida pessoal. Parece óbvio, mas para o capitalismo, não é.

A Alemanha, um dos países mais industrializados do planeta, também aposta em jornadas reduzidas. E mesmo com menos horas de trabalho, sua produtividade supera a de países como os Estados Unidos, que ainda se orgulham de jornadas extensas e vidas miseráveis.

Claro, há resistência empresarial. Há patrões que alegam prejuízos, dificuldades de adaptação, aumento de custos. Mas a verdade é que o capital sempre resistirá a qualquer medida que diminua sua margem de lucro, ainda que isso signifique uma sociedade mais saudável. O lucro, para o capitalista, vale mais do que a vida.

4. A Jornada de Trabalho e a Realidade Brasileira

No Brasil, o atraso é institucionalizado. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), criada nos anos 1940, estabeleceu limites formais à jornada, mas o que se vê na prática é um modelo de submissão à rotina 6×1, que virou regra para milhões de trabalhadores, especialmente no comércio e no setor de serviços.

A escala seis por um é um tipo de escravidão moderna: seis dias de desgaste físico, mental e emocional para um único dia de “descanso” – que, muitas vezes, é usado para resolver pendências, cuidar da casa, enfrentar filas, ou simplesmente tentar recuperar o fôlego. O que sobra para o lazer, para os filhos, para o estudo, para a cultura, para a vida? Nada.

O discurso do “empreendedorismo” agrava esse cenário. O trabalhador precarizado, sem direitos, é incentivado a “ser seu próprio patrão”, quando, na verdade, está apenas sem patrão direto, mas com vários indiretos, e sem nenhum direito assegurado. E isso tudo é vendido como “liberdade”. É o que chamamos, hoje, de uberização do trabalho.

A Reforma Trabalhista de 2017, vendida como solução para o problema do desemprego, foi, na prática, um processo de destruição da proteção ao trabalho. Criou formas legais de burlar direitos, facilitou demissões, enfraqueceu os sindicatos e fortaleceu os empregadores. O banco de horas, por exemplo, se transformou em um mecanismo de apropriação ainda mais violenta do tempo do trabalhador, sob o pretexto da “flexibilidade”.

A desculpa do desemprego estrutural e do subemprego é usada como chantagem: “ou aceita essa jornada extensa, ou fica sem trabalho”. E milhões aceitam, por necessidade, por desinformação, por falta de alternativa. Assim, a exploração se disfarça de oportunidade.

5. Propostas para Implementação da Redução da Jornada no Brasil

Falar em redução da jornada de trabalho no Brasil parece utopia para alguns. Mas utopia maior é acreditar que a população pode continuar trabalhando seis dias por semana, 8, 10, 12 horas por dia, sem que isso exploda em colapso físico, psíquico e social. A realidade já está à beira do insustentável: altos índices de doenças ocupacionais, sofrimento mental, uso abusivo de medicação, e famílias desfeitas pelo excesso de trabalho e pela ausência de tempo de convivência.

A proposta aqui é clara: transição para jornadas de 30 a 36 horas semanais. Isso significa trabalhar cinco dias por semana, com 6 ou 7 horas por dia. Não se trata de “reduzir a produtividade”, mas de adequar o trabalho à vida – e não o contrário. É preciso eliminar a escala 6×1, resquício de um tempo em que o trabalhador não tinha sequer o direito de pensar.

Para isso, o Estado precisa agir. Políticas públicas devem incentivar a redistribuição do trabalho. Se uma pessoa pode fazer em 30 horas o que antes era feito em 44, isso significa que outra pode ser contratada com as horas “liberadas”. É uma estratégia contra o desemprego, contra a informalidade, e a favor da dignidade.

Outro ponto é a regulação das horas extras. Hoje, a lógica é: quanto mais a pessoa se sobrecarrega, mais ela ganha – ao custo da própria saúde. Isso precisa mudar. Horas extras devem ser exceção extrema, com limites rígidos e compensações maiores. O trabalhador não pode ser forçado, direta ou indiretamente, a abrir mão da própria vida por alguns reais a mais no fim do mês.

Ao analisar o caso brasileiro quando da redução da jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais, Dal Rosso (1988) conclui que a redução de 8,33 % da jornada legal resultou na criação de, aproximadamente, 0,7 % de novos postos de trabalho, o que pode ser explicado pelo aumento da utilização de horas extras, que saltou de 24,4 % nos 6 meses anteriores à promulgação da Lei Constitucional para 41,2 % nos seis meses que a sucederam. Muitos trabalhadores viram uma oportunidade de aumentarem sua renda e, com isso, acabaram prejudicando a criação de novos postos de trabalho e favorecendo a lógica capitalista. Incentivando e participando dessa prática, o trabalhador dá um “tiro no próprio pé”, já que o pagamento de horas extras não é incorporado ao rendimento fixo do empregado. Assim, ao invés de lutar por aumento de salário ou mesmo pela redução da jornada de trabalho, o trabalhador se rende à prática imediatista e individualista da percepção das horas extras.

O banco de horas, hoje usado para mascarar abuso, precisa ser revisto e rigidamente regulado, com fiscalização sindical e critérios claros. A “negociação direta entre patrão e empregado”, exaltada pela reforma trabalhista, é uma farsa em um país com altíssimo desemprego, onde o medo de perder o emprego é maior que qualquer direito formal. Para o capitalista, é o “paraíso”: menos custos com horas extras e contratações em períodos de demanda elevada; para o trabalhador, mais exploração: horas extras não são remuneradas e sua contabilização é dificultada, além de perder e o controle do seu tempo livre, ficando à disposição do empresário, conforme sua necessidade e as exigências de demanda. E há ainda mais um agravante: o dia de compensação não é uma escolha do trabalhador, mas do patrão. Para acirrar ainda mais a situação do empregado, as novas tecnologias, como telefone celular, internet, também colocam o trabalhador 24 por dia à disposição do empregador. São comuns situações em que o trabalhador fica em “estado de alerta”, casos em que não há remuneração, já que a mesma só se efetiva quando ocorre o contato.

A redução da jornada de trabalho traz investimentos  para os capitalistas, a elevação do salário horário dos trabalhadores, custos de contratação de novos empregados e o pagamento de um maior número de horas extras. Isso pode ser pago pelo Estado por meio de isenções fiscais ou subsídios financeiros. Sem contar que os trabalhadores não dão despesas para as empresas, visto que um trabalhador que não pagar o seu próprio salário, com todos os encargos, além de gerar lucro, não será mantido na empresa.

Nas experiências internacionais, o custo foi rateado por todos os setores: capitalistas, trabalhadores, sociedade e governo, com isenções fiscais, diminuição da margem de lucro e aumento da produtividade.

O certo é que todos ganham com a redução da jornada de trabalho, pois trabalhadores exaustos produzem menos e adoecem mais. Se tiverem mais tempo para se dedicarem à família, ao lazer e às suas necessidades gerais, ficarão mais bem dispostos e felizes, aumentando sua produtividade no trabalho e a mais – valia do patrão.   

Por fim, é fundamental uma mudança cultural. O trabalho não pode mais ser visto como o centro absoluto da existência. As pessoas precisam ter tempo para cuidar de si, para viver suas relações, para criar, descansar, estudar, pensar, existir. O tempo humano é mais valioso que qualquer produtividade. E defender isso é, hoje, um ato de resistência civilizatória.

Conclusão

Ao longo deste artigo, examinamos a exploração do trabalho humano sob a ótica da crítica marxista. Vimos como o sistema capitalista se sustenta na apropriação da mais-valia, na alienação do trabalhador e na naturalização da sobrecarga como algo positivo ou inevitável. Analisamos a luta histórica do proletariado por limites dignos à jornada, as experiências bem-sucedidas de países que ousaram desafiar a lógica produtivista e, principalmente, a situação degradante da jornada no Brasil – onde a escala 6×1 ainda é tratada como normal, e o descanso, como luxo.

A defesa da redução da jornada de trabalho é, portanto, mais do que uma pauta econômica ou trabalhista. É uma questão de justiça social, saúde coletiva e reconstrução da vida em bases mais humanas. O tempo precisa deixar de ser propriedade do capital. É hora de colocar a vida no centro da organização social.

Romper com a lógica do “viver para trabalhar” é abrir espaço para uma sociedade que valoriza o ser, e não apenas o produzir. O futuro do trabalho – se quiser ser digno – precisa passar pela redistribuição do tempo, pela eliminação da escala seis por um e pelo fim da escravidão moderna disfarçada de produtividade.

Como dizia Marx, “a verdadeira riqueza é o tempo livre”. E talvez essa seja a frase mais revolucionária que podemos levar a sério hoje.

Referências Bibliográficas

  • DAL ROSSO, Sadi. Jornada de trabalho: duração e intensidade. 2002.
  • CALVETE, Cássio da Silva. Redução da jornada de trabalho: uma análise econômica para o Brasil. 2003-2006.
  • FRACALANZA, Paulo Sérgio. A redução da jornada de trabalho em Marx: por que falham as previsões novo-keynesianas sobre os impactos dessa medida? Análise Econômica, v. 23, n. 43, 2009.
  • MICHAEL LÖWY. Marx e a luta pela redução da jornada de trabalho. Lutas Sociais, v. 21, n. 38, 2017.
  • O tempo de trabalho: uma chave analítica. Soc. Estado, v. 28, n. 3, 2013.
  • FONSECA, Maíra Silva Marques da. Redução da jornada de trabalho a partir da análise do sistema capitalista de produção. 2011.
  • Redução da jornada de trabalho e qualidade dos empregos: entre o discurso, a teoria e a realidade. Revista Sociologia e Política, v. 19, n. 38, 2011.

*Carina Ribeiro de Carvalho Costa é professora de química, graduada pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ) e pós graduada em Metodologias do Ensino de Química. Realizou o curso de Economia Crítica na Visão Marxista, com o Professor e Economista Diego Eymard Carvalho Pinto, pelo Instituto Soyuz.

Este é um artigo de opinião. O posicionamento do autor não representa necessariamente as ideias do PT-MG