O Partido dos Trabalhadores surgiu da necessidade sentida por milhões de brasileiros e brasileiras de intervir na vida social e política do país para transformá-la. Desde então, o PT vem sendo protagonista em encampar reivindicações da classe trabalhadora, do campo e da cidade, do movimento feminista, lgbtqia+, contra o racismo e todas as formas de opressão intra-espécie humana. Com o tempo, a sociedade vai se modificando e novas pautas e reivindicações sociais assumem importância. Com o reconhecimento da senciência animal – de que todos os animais sentem de forma consciente, manifestam interesses na busca pelo conforto e prazer e fuga de dores e medos, atuam como protagonistas de suas próprias histórias – a defesa dos direitos animais conquistou relevância em todas as camadas da sociedade.
Sendo o maior partido de esquerda do Brasil, o PT – que no manifesto de sua fundação afirmou que “buscará conquistar a liberdade para que o povo possa construir uma sociedade igualitária, onde não haja explorados nem exploradores” – tem um papel fundamental na construção dessa nova sociedade, onde os direitos animais dizem respeito também aos direitos humanos e a libertação dos animais humanos e não humanos é o grande objetivo final. Quando violamos os direitos animais, os humanos também acabam vitimados, seja pela proliferação de pandemias, pelo impacto da degradação ambiental no clima e pela repercussão de tudo isso na saúde, seja pelos desdobramentos desses problemas na segurança e na soberania alimentares.
Sabemos o quanto é difícil pensar em direitos animais num mundo em que os direitos humanos são colocados à prova todos os dias. Apesar do reconhecimento formal, negros, mulheres, indígenas e pobres precisam se afirmar todos os dias como humanos portadores de direitos e lutar por seu lugar ao sol. Por isso, muitos questionarão a pertinência de se investir esforços nessa causa, quando ainda há tantas lutas a serem travadas pela vida da nossa própria espécie. Mas a verdade é que lutar pelos direitos animais fortalece a luta pelos direitos humanos, pois a base das opressões e violências é a mesma: o capitalismo, a dominação, o patriarcado, o racismo, a xenofobia, o especismo. Trata-se sempre da subjugação do mais fraco pelo mais forte.
Em que pese a aura de universal, tradicionalmente, a categoria “humano” tem sido utilizada para distinguir o indivíduo branco, masculino, heterossexual e europeu dos demais animais. As minorias raciais e étnicas, mulheres e outros grupos subjugados e marginalizados sempre foram identificados como “animal” e relegados a uma condição inferior. De forma que “animal” é uma categoria abrangente, a qual se refere a espécies não humanas, mas também a todos os grupos humanos espoliados de direitos.
Por tudo isso, defendemos que, sem desafiar a falsa divisão entre animais humanos e não humanos, a libertação de ambos está destinada a fracassar. Não é coerente gritar por liberdade, enquanto bilhões de animais seguem confinados em galpões, jaulas, gaiolas, estábulos, granjas, laboratórios e outras formas de cárcere, destinados a uma vida de solidão, miséria e dor. Não há como bradar por justiça, quando seguimos explorando seres sencientes para nossa própria conveniência. Não é possível conceber igualdade, se considerarmos que nossa dor é mais relevante que a de outras espécies. Não se pode vislumbrar a paz, sem praticar a solidariedade para além da espécie humana.
Buscando um referencial ético, justo, solidário e inclusivo para todos os seres sencientes da Terra, o Setorial de Direitos Animais do PT conclama militantes, dirigentes e parlamentares do Partido a pautarem sua ação política pelos princípios e diretrizes a seguir.
Princípios Do Setorial De Direitos Animais Do Partido Dos Trabalhadores
O Setorial de Direitos Animais do Partido dos Trabalhadores funda-se nos seguintes princípios:
1. Senciência – Animais não humanos são seres sencientes, com capacidade para sentir dor, medo, alegria, prazer e angústia, de forma consciente. Eles sabem que estão vivos e desejam permanecer vivos, desfrutando de uma existência com propósitos próprios de sua espécie e de sua condição de sujeito em meio aos seus, com interesses e direitos que merecem ser respeitados tanto quanto aqueles dos animais humanos. Embora haja diferenças biológicas e sociais entre os animais humanos e os não humanos, a capacidade de vivenciar a dor nos iguala e é um convite para ampliarmos nossas considerações morais e jurídicas a respeito.
2. Dignidade – O direito constitucional a uma existência digna é extensivo aos animais não humanos. A dignidade baseia-se no reconhecimento de que toda pessoa é digna e, como tal, deve ser respeitada. O que torna um indivíduo digno é não considerá-lo como mero objeto da vontade alheia. Da mesma forma, toda vida animal tem um valor intrínseco, um fim em si mesmo, sendo, portanto, digna. Os animais não são coisa, não são objeto, pelo contrário, são sujeitos de direito. Possuem direitos materiais e subjetivos, substanciais e peculiares a cada espécie, como o direito de viver uma vida livre de sofrimento, exploração e dor. Seu direito básico à vida exige, portanto, sua liberdade, plena de integridade física, moral e psicológica.
3. Antiespecismo – O especismo é a descriminação que praticamos contra os animais nascidos de outras espécies que não humana. Em alguns casos, o especismo também pode se referir à atribuição de valores e direitos diferenciados entre espécies não humanas, na definição de quais espécies elegemos para estima e quais elegemos para tormento e morte (especismo eletivo)1 . Pautar-se pelo antiespecismo é lutar pelo reconhecimento de que nenhuma vida, de qualquer espécie, vale mais que outra.
4. Não-violência – Para existir, o ser humano não precisa violentar outras pessoas humanas ou não humanas, ou o meio ambiente. Todos desejamos a felicidade e queremos evitar o sofrimento. O princípio da não-violência impele o sujeito a não causar sofrimento a si próprio e a outros seres sencientes, afastando-o de ações que prejudicam e agridem a experiência ou a expectativa de felicidade de outros animais, sejam eles humanos ou não humanos.
5. Universalidade – A Constituição Brasileira não tolera discriminação. Tanto os humanos quanto os outros animais devem ser reconhecidos como titulares de direitos fundamentais próprios. Nesse sentido, o poder público e a sociedade devem promover a universalidade protetiva, proibindo condutas que soneguem os direitos fundamentais de qualquer espécie, inclusive nos âmbitos legislativo e administrativo.
6. Primazia da liberdade natural – Primar pela liberdade natural equivale a respeitar a dignidade animal, compreendendo que os animais, em especial os silvestres, têm direito à vida e à liberdade natural, devendo ser prioritariamente restituídos a seu habitat, onde podem ter seu comportamento natural. Para isso, é também necessário preservar e respeitar a integridade dos habitats naturais para que a liberdade natural seja efetivada. O princípio da liberdade natural repudia as práticas injustificadas de qualquer tipo de cativeiro.
7. Educação animalista – É dever constitucional do Estado promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino, bem como a conscientização pública quanto à preservação do meio ambiente. A educação animalista insere-se nesse dever e prevê a implementação de programas e políticas educacionais que colaborem para o reconhecimento da dignidade animal e de seus direitos fundamentais, desautorizando as práticas cruéis e possibilitando a escolha de hábitos de consumo éticos, conscientes e direcionados à construção de uma sociedade livre, justa e solidária para todos, independentemente da espécie.
8. Veganismo – Trata-se de uma prática política e de consumo que objetiva extinguir todo tipo de exploração animal. No veganismo, entende-se que nenhum indivíduo senciente deve ser propriedade de outro, reduzindo este sujeito à noção de recurso, insumo, matéria-prima ou qualquer outro elemento que o torne um objeto para o uso humano.
9. Proibição do retrocesso – Em se tratando de direitos fundamentais, este princípio constitucional reivindica a manutenção das conquistas legislativas e jurisprudenciais, impedindo que novas leis possam significar abolição, redução ou ineficácia dos avanços alcançados e determinando, portanto, a preservação e a garantia de um conjunto de proteções do direito fundamental a um ambiente ecologicamente equilibrado, incluindo-se aí a proteção dos não humanos
:: A Luta pelo da Exploração dos Animais
Diretrizes Do Setorial De Direitos Animais Do PT
O Setorial de Direitos Animais do Partido dos Trabalhadores seguirá e incentivará a adoção das seguintes diretrizes por militantes, dirigentes e parlamentares do Partido:
1. Denunciar e combater a violência contra animais humanos e não humanos, contribuindo para o estabelecimento de uma cultura de paz e não-violência, que leve em consideração a vida de todos os seres sencientes;
2. Denunciar e combater o especismo que – assim como machismo, sexismo, racismo, LGBTfobia, capacitismo, misoginia, xenofobia, aporofobia – impede a construção e a consolidação de uma sociedade justa, solidária, livre de exploração, discriminação e opressão;
3. Apoiar, incentivar e promover iniciativas de inclusão da temática dos Direitos Animais nas instâncias consultivas e deliberativas do PT;
4. Apoiar e promover campanhas e ações de conscientização pelos Direitos Animais, dentro e fora do PT;
5. Estimular a garantia de recursos no orçamento público e a participação ativa de parlamentares do PT em frentes parlamentares, bem como destinação de emendas parlamentares para o cumprimento das leis pelos Direitos Animais;
6. Apoiar e incentivar a criação de fundos municipais, estaduais e nacionais de proteção aos Direitos Animais, para promoção de políticas públicas e articulação de ações do Estado, da sociedade civil e da comunidade internacional;
7. Apoiar e incentivar a participação popular nas instâncias municipais, estaduais e nacionais de debate e deliberação sobre Direitos Animais;
8. Apoiar, incentivar e promover iniciativas de inclusão da temática dos Direitos Animais nas redes pública e privada de ensino de todos os graus;
9. Cobrar transparência nos procedimentos dos Centros de Controle de Zoonoses, com a publicação sistemática de dados, tais como número de animais acolhidos, número de animais doados, número de animais acompanhados em pós-adoção, número/motivo de animais sacrificados;
10. Apoiar e incentivar a reabilitação e a adoção de animais acolhidos nos Centros de Controle de Zoonoses;
11. Apoiar e incentivar programas de conscientização para guarda responsável e políticas públicas previstas em lei de castração gratuita de animais domésticos e domesticados, em especial daqueles sob a guarda de OSCIPS, ONGs, protetores independentes e tutores de baixa renda e vulnerabilidade social, assim como os animais vítimas de acumulação, em situação de rua, inclusive os comunitários;
12. Apoiar e incentivar a adoção de animais domésticos e atuar pela proibição da reprodução desses animais;
13. Apoiar e incentivar iniciativas de criação e expansão de unidades de saúde para atendimento e tratamento gratuito de animais domésticos e domesticados, em especial daqueles sob a guarda de OSCIPS, ONGs e tutores de baixa renda, assim como de animais em situação de rua e comunitários;
14. Atuar pela proibição da exploração da mão de obra de animais não humanos, especialmente em atividades como tração de veículos (carroças, charretes etc.), cães de guarda etc.
15. Atuar pelo acolhimento e cuidados dos animais resgatados em atividades exploratórias, destinando-os aos centros de acolhidas e santuários de responsabilidade estatal.
16. Atuar pela proibição de fogos de artifício, bombas, morteiros, busca-pés e demais materiais pirotécnicos ou explosivos ruidosos, com a finalidade de entretenimento humano, em espaços públicos e privados;
17. Atuar pela proibição de espetáculos com apresentação e exibição de animais para entretenimento humano, tais como circos, rodeios, vaquejadas, exposições, lutas, corridas, zoológicos, aquários etc.;
18. Atuar pela transformação dos zoológicos em santuários, para preservação de espécies ameaçadas de extinção e acolhimento de animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, vítimas de acidentes, exploração, maus tratos, abandonos, atropelamentos, queimadas, tráfico etc., visando a seu tratamento e sua reintegração ao habitat natural sempre que possível;
19. Apoiar o fortalecimento e a atuação integrada de estruturas públicas de fiscalização e preservação da vida animal, cobrando dotação orçamentária, capacitação dos agentes, concursos públicos para provimento de pessoal, de órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Centros de Triagem de Animais Silvestres (CETAS), Delegacias Especializadas em Crimes Ambientais (DEMA) etc.;
20. Atuar pela destinação de verbas públicas para atendimento de animais vítimas de abandono e outros tipos de maus tratos, bem como aos santuários já atuantes e os santuários oriundos dos zoológicos a serem extintos;
21. Atuar pela proibição da utilização de animais vivos para estudos em instituições de pesquisa e de ensino, incentivando a utilização de métodos alternativos;
22. Atuar pela proibição da utilização do uso de animais vivos em testes de produtos cosméticos, de higiene pessoal, limpeza e perfumaria, incentivando a utilização de métodos alternativos;
23. Atuar pela proibição da exportação de animais vivos, incluindo animais aquáticos, para fins de abate no destino;
24. Atuar pela proibição de criação e abate de animais para o comércio de pele, incentivando a utilização de materiais alternativos;
25. Atuar pela proibição de atividades de caça e pesca esportivas;
26. Atuar pela proibição da utilização de superfícies espelhadas em fachadas de edifícios, por levar a óbito milhares de pássaros que colidem com o reflexo do céu;
27. Apoiar e incentivar a capacitação de profissionais da área da saúde e da segurança alimentar e nutricional para difusão dos benefícios da dieta vegetariana estrita;
28. Apoiar e incentivar a difusão da alimentação vegetariana estrita, inclusive com valorização de pequenos agricultores, da agricultura familiar, orgânica e da permacultura, livres de agrotóxicos;
29. Apoiar e incentivar a oferta de refeições vegetarianas estritas em restaurantes populares, estabelecimentos públicos e privados, incluindo redes de ensino, saúde, assistência social e privação de liberdade;
30. Atuar pela obrigatoriedade de informar a presença de todos e qualquer ingredientes de origem animal na rotulagem de produtos, em toda e qualquer quantidade; 31. Atuar pela aprovação de incentivos fiscais e tributários a empreendimentos livres de exploração animal;
32. Atuar pela proibição de veiculação de propaganda incentivando o consumo de produtos de origem animal;
33. Atuar pela aprovação da obrigatoriedade de informar, no rótulo dos produtos, os riscos à saúde humana provocados pelo consumo de produtos de origem animal, incluindo-se os lácteos e derivados;
34. Atuar pela preservação de florestas, rios, nascentes e toda a vida selvagem, bem como promover a conscientização sobre o impacto da pecuária na devastação ambiental, com repercussões no clima e na proliferação de pandemias;
35. Atuar pela proibição da criação intensiva de animais, em especial, pelo banimento das gaiolas de gestação para porcas reprodutoras e das baterias de gaiolas para galinhas poedeiras; pelo fim do confinamento de vitelos na indústria do baby beef e pelo fim da criação de peixes em gaiolas flutuantes, pois tais práticas violam a proibição constitucional de maus tratos a animais e os priva da liberdade de expressar seu comportamento natural;
36. Promover espaços de debates, discussões, aulas e palestras, de cunho educativo, sobre a importância e a amplitude do veganismo em todas as suas possibilidades – ambiental, social, nutricional, política, jurídica, econômica e ético-filosófica – nas áreas de saúde, direito e educação, dentre outras.
37. Atuar pela proibição de pássaros em gaiolas e viveiros;
38. Promover a criação de conselhos com fundos captadores de destinações fiscais;
39. Incluir o trânsito de carroças e a presença de animais de grande porte nas ruas no escopo de atuação dos órgãos públicos responsáveis pela mobilidade e segurança urbana;
40. Incluir no ciclo orçamentário – PPAG, LDO, LOA – previsão orçamentária para ações públicas, governamentais e não governamentais e proteção dos Direitos Animais.