*Por Ana Pimentel
Outubro de 2023 entrará para a história como o mês mais quente já registrado, com o ano caminhando para se tornar o mais escaldante dos últimos 125 mil anos, alerta o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), órgão da União Europeia. Este não é apenas um número distante ou uma estatística isolada: é um grito de socorro da Terra, clamando por nossa atenção e ação imediata. Novembro também ficará marcado por tragédias ocasionadas pelo calor extremo, aliado ao capitalismo predatório, como a morte da jovem Ana Clara Benevides, morta durante o show da cantora Taylor Swift, um evento em que as pessoas foram proibidas de entrar com garrafinhas de água e a sensação térmica beirou os 60º C no Rio de Janeiro.
O Acordo de Paris, celebrado em 2016, tinha como objetivo primordial encontrar soluções para limitar o aumento da temperatura global a 1,5ºC até o final deste século. No entanto, as projeções atuais indicam que, se continuarmos nesse ritmo desenfreado de emissões, podemos ultrapassar 2ºC de aumento nos termômetros. Estamos, literalmente, no limite de um desastre climático irreversível, com graves consequências ambientais e sanitárias.
No Brasil, a paisagem exuberante da Amazônia se transforma diante de nossos olhos, rios alcançam níveis históricos baixos, e os icônicos botos cor-de-rosa enfrentam a ameaça de extinção. Enquanto isso, no Sul e Sudeste, inundações causam prejuízos incalculáveis. No litoral, a ressaca tem arrastado utensílios, pessoas e invadido estabelecimentos. O aquecimento global não escolhe regiões, partidos políticos, classe social ou atende a qualquer critério: impacta o país – e o mundo – indiscriminadamente.
As temperaturas recordes dos mares, alimentadas pelas emissões contínuas de carbono e pelo fenômeno El Niño, estão criando tempestades mais violentas, impactando não apenas o clima, mas a vida em todas as suas formas. Para nós, o aumento extremo das temperaturas resulta em riscos elevados de insolação, desidratação e até mesmo mortes, afetando especialmente idosos e crianças. Além disso, a poluição do ar agravada pelo clima em mudança está exacerbando doenças respiratórias e cardiovasculares, levando a um crescimento na demanda por tratamento médico.
As alterações climáticas também provocam a expansão de doenças transmitidas por vetores, como malária e dengue, colocando mais pessoas em risco. Com a segurança alimentar e o acesso à água potável sob ameaça, há o risco de uma alta em casos de desnutrição e doenças relacionadas à água. Por fim, mas não menos importante, a crise climática tem um impacto extremamente significativo na saúde mental, com as incertezas e riscos relacionados a eventos climáticos extremos causando estresse e ansiedade. A urgência de ações coordenadas é imperativa para fazer frente a todos estes impactos.
Não podemos mais esperar. O momento exige ações concretas e decisivas. Ainda em novembro, realizaremos uma audiência pública reunindo o Ministério da Saúde, o Ministério do Meio Ambiente, a Fiocruz e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). Precisamos debater estratégias que vão além das palavras. No que tange às políticas públicas, temos arregaçado as mangas para propor mudanças que, literalmente, podem salvar vidas.
A curto prazo, uma delas é o projeto de Lei Ana Benevides para distribuição gratuita de água e eventos, garantindo que a população tenha acesso à hidratação, um direito básico, sobretudo sob as ondas de calor intenso que temos enfrentado e ainda vamos enfrentar. Outra proposta diz respeito à transformação dos servidores do meio ambiente em trabalhadores essenciais, como os da saúde e da educação, valorizando a carreira e a remuneração de quem atua ativamente para a preservação do planeta e a nossa própria. A longo prazo, defendemos a inclusão de educação ambiental e sanitária no currículo básico das escolas, para que as novas gerações sejam signatárias desde cedo de um pacto de consciência ambiental com o qual nós, infelizmente, falhamos.
O planeta não espera, e o calor não pede licença. É hora de ações concretas antes que os efeitos sejam irreversíveis e a história nos julgue como negligentes. Não há opção.
Que a audiência pública seja o ponto de partida para ações coordenadas e efetivas em prol do nosso planeta.
*Ana Pimentel é médica, deputada federal (PT-MG) e vice-líder da bancada do partido na Câmara dos Deputados.
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Este é um artigo de opinião. O posicionamento do autor não representa necessariamente as ideias do PT-MG.